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2 de Maio de 2024

Para movimento negro, campanha #somostodosmacacos reproduz racismo

Publicado por Fernanda Favorito
há 10 anos

A campanha lançada pelo jogador Neymar Jr. Gerou polêmica. De um lado, artistas, jornalistas e até a presidenta Dilma Rousseff manifestaram apoio à ideia de que “temos todos a mesma origem, e nada nos difere”, conforme escreveu a presidenta, pelo Twitter. De outro, integrantes do movimento negro usaram as mesmas redes sociais para criticar a campanha #somostodosmacacos.

O professor de história e integrante da UNEafro Brasil Douglas Belchior avalia que a postura do jogador Daniel Alves, que comeu uma banana jogada contra ele, em partida realizada no último domingo (27), foi “interessante, provocativa”, mas ele critica a campanha deflagrada em seguida. De acordo com Belchior, a associação de negros a macacos é uma forma de reprodução do racismo. Em seu blog, ele divulgou texto que explica as origens dessa compreensão: a tese evolucionista de que os seres humanos possuiriam diferenças provocadas pela seleção natural, e de que africanos e aborígenes estariam mais próximos dos macacos do que os europeus, por exemplo.

A polarização foi acentuada ontem, quando a origem da campanha, iniciada com a divulgação da foto de Neymar segurando uma banana, ao lado do filho, foi revelada. A imagem faz parte de uma campanha publicitária criada pela agência Loducca, em resposta ao pedido do pai do jogador, Neymar da Silva Santos, que procurou a empresa após o filho e Daniel Alves terem sido vítimas de racismo, na final da Copa do Rei, entre Barcelona e Real Madrid, no último dia 16.

No vídeo de divulgação da campanha #somostodosmacacos, os idealizadores da proposta expressam opinião sobre como deve ser enfrentada a desigualdade racial: “A melhor maneira de acabar com o preconceito é tirar seu peso, fazendo a pessoa preconceituosa se sentir sem poder”, diz a frase que aparece sobre imagens de crianças negras jogando. “Uma ofensa só pega quando irrita você. Vamos acabar com isso. #somostodosmacacos”, conclama, usando a hashtag que já virou produto da marca do apresentador Luciano Huck, que também publicou foto com bananas.

Pelas redes sociais, a jornalista Aline Pedrosa defende a iniciativa: “Mesmo sendo branca, me reconheço com traços dos meus ancestrais, que são negros. Não nego minhas origens, muito pelo contrário, as estudo e as exalto. Para mim, a mobilização significa união – todos somos um – e, acima de tudo, desprezo a uma atitude vergonhosa como essa, e que, sabemos, não rola só fora do Brasil, muito pelo contrário”.

O cineasta Joel Zito de Oliveira, que dirigiu o filme A Negação do Brasil, que trata da representação dos negros na mídia, avalia a campanha como um “equívoco” por esconder a negritude e não ser capaz de enfrentar o racismo. Ele considera que a grande proporção obtida pela iniciativa também está relacionada ao conteúdo dela. “Tudo que é feito, e que de fato não incomoda e não muda a questão racial no Brasil, tende a ter aceitação mais fácil”, afirma. “Branco comendo uma banana ou colocando sobre a cabeça pode virar Carmem Miranda, carnaval. Com o negro é outra coisa. Mas a postura da sociedade brasileira sempre foi no sentido de evitar o confronto”, critica.

Ao ser questionado sobre como as mídias sociais repercutiram o caso, ele foi otimista: “Elas podem ser apropriadas para dar visibilidade a vozes que não tinham acesso às grandes mídias”. Por meio dessas mídias, casos como a morte do dançarino Douglas Rafael (conhecido como DG) e o desaparecimento do pedreiro Amarildo vieram à tona. “A novidade não é o desaparecimento, a morte ou o racismo. A novidade é que o questionamento das populações negras mais pobres é feito nas mídias sociais e chega à grande mídia”.

Já Douglas Belchior diz que a hashtag “tenta esconder as desigualdades raciais, a violência, o extermínio, e reforça a ideia de que no Brasil se vive uma democracia racial”. Para ele, a campanha cumpriu um “desserviço” ao mudar o foco da discussão pública do assassinato do dançarino DG, no Rio de Janeiro, para uma campanha que propõe o apaziguamento dos problemas.

“Vivemos no Brasil uma escalada assombrosa da violência racista. Esse tipo de postura e reação despolitizadas e alienantes de esportistas, artistas, formadores de opinião e governantes têm um objetivo certo: escamotear seu real significado do racismo, que gera desde bananas em campo de futebol até o genocídio negro, que continua em todo o mundo”, alerta.

Para a Agência Brasil, a ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Luiza Bairros, assinalou que a campanha é superficial e busca transformar a imagem do macaco em algo positivo, quando tem um significado essencialmente negativo para negros e negras. “O que existe é uma tendência de considerar o racismo como um fenômeno superficial na sociedade brasileira, ou em qualquer outro lugar do mundo; algo que se manifesta como um dado isolado, como uma expressão de indivíduos que praticam atos racistas”, avalia.

A ministra espera, contudo, que a provocação seja “uma porta de entrada para que a sociedade possa aprofundar as questões”. A lição a ser tirada, segundo ela, é que “o combate ao racismo vai precisar de uma manifestação contrária de toda a sociedade brasileira, mas para isso precisaremos ir mais fundo, identificando outras repercussões do racismo, que não se expressam só no futebol”.

As manifestações de racismo no âmbito do esporte, sofridas também por Tinga, do Cruzeiro, e outros jogadores, não são novas. Na década de 1910, jogadores do América chegaram a utilizar pó de arroz para se parecerem com brancos. Já em 1924, o Vasco da Gama redigiu a chamada Resposta Histórica, carta em que nega a exigência da Associação Metropolitana de Esportes Atléticos para que se desfizesse dos 12 jogadores negros, mulatos, nordestinos ou pobres que atuavam na equipe.

Agora, 90 anos depois, o Brasil está prestes a sediar a Copa do Mundo, e deve fazer uma campanha contra a discriminação racial durante o campeonato, conforme anunciado pela presidenta Dilma Rousseff, no domingo (28). A ministra Luiza Bairros informou que a Seppir participa da elaboração da campanha, e espera que o país “seja capaz de mandar para o mundo e para a sociedade brasileira, especificamente, a mensagem de que o racismo não pode ser tolerado no futebol nem em nenhum espaço da sociedade”.

Já Douglas Belchior torce para que o mundial seja também espaço de visibilidade dos problemas do país: “A Copa do Mundo coloca o Brasil na vitrine do mundo. A posição dos movimentos é aproveitar esse momento para escancarar uma realidade que é maquiada, no Brasil. Nós queremos demonstrar que vivemos um genocídio, que vivemos sob a égide de polícias extremamente violentas e que atingem sobretudo a população negra”.

O cineasta Joel Zito espera que a campanha a ser veiculada seja capaz de aprofundar a abordagem sobre a questão racial: “Aproveitar a oportunidade da Copa para realizá-la é muito bem-vinda. Inclusive porque a sociedade brasileira vai conviver com segmentos culturais com os quais nunca conviveu. Segmentos que recebem, há anos, a ideia de que o Brasil vive uma democracia racial. Ela [campanha] é necessária, bem-vinda, mas tem que ser inteligente”, defende.

Fonte: http://www.capitalteresina.com.br/noticias/geral/para-movimento-negro-campanha-somostodosmacacos-rep...

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Sou negro e entendi que a campanha tem um tom de ironia e irreverência, não sei se deveria ser levada ao pé da letra. O fato é que a atitude confrontou de maneira sarcástica a agressão e causou algum vexame ao fascismo subliminar que vive o mundo hoje. Na minha opinião, a campanha institucional dos países e da FIFA, na base do fraquíssimo "não ao racismo" é uma demagogia monstruosa e o tipo de gente que costuma ter atitudes racistas urina em cima dela.Tais crimes só são combatidos com o constrangimento moral "in loco" do agressor, tal como fez o Daniel, seguido de detenção imediata do criminoso, qualquer outra atitude é só "pro forma", para apaziguar o burburinho. continuar lendo

O problema, Newton, é que para entender o tom irônico da campanha é preciso ter um mínimo de inteligência. Você está certo não é para levar ao pé da letra. continuar lendo

Sou branca e também entendi! continuar lendo

O pobre e preto que sente o verdadeiro racismo na pelé todo dia é esquecido. Quando ocorre com alguem famoso, ai sim vamos combater o racismo. Quanta hipocrisia. continuar lendo

O tom da campanha "#somostodosmacacos", ao menos para quem a assumiu de boa-fé é literal:
"Somos, todos nós (brancos, amarelos, negros, vermelhos ou qualquer combinação imaginável) macacos. Somos iguais."
Quanto aos que aderiram de má-fé, ou tentam deturpar esse sentido, prefiro não comentar. continuar lendo

Não há racismo maior que considerar ao negro e ao índio como seres desprovidos de inteligência e habilidades suficientes para concorrer a vagas em universidades e empregos em condições de igualdade com as demais raças. Cotas são sim a institucionalização do racismo oficial. continuar lendo

Concordo plenamente. continuar lendo

Completamente equivocada a sua posição, mas como estamos a falar sobre racismo no futebol, não convém perdemos o foco, O STF espancou por unanimidade a tese da inconstitucionalidade das cotas na universidade, agora estamos na aplicação em outras áreas, mercado de trabalho e tantas outras que estamos sub-representados. continuar lendo

Mais ou menos assim: "Se hay (apoio) soy contra, se no ay yo soy contra también"! A quem interessa alimentar isso? continuar lendo

O movimento negro ao meu ver está querendo ser a última bolacha do pacote. Se os líderes desse movimento estiverem em uma praia deserta cheio de mulheres bonitas, rodeados de serras de ouro e sem nenhuma concorrência, mesmo assim eles iriam enxergar o racismo em tudo. Quando certos indivíduos passam a viver de uma doutrina, nada que se faça vai mudar a visão deles. A isso eu chamo de justificar existência através de teorias, ou seja, nunca se finda! Tudo é racismo! E o pior é que acaba criando um racismo defensivo, pois as pessoas passam a evitar certos grupos com medo de serem acusados injustamente, pois qualquer discussão mais aflorada por motivos políticos, ou religioso que seja, o cara mete o racismo no meio e diante as leis petralhas...a verdade tem um lado só...as minorias...então...cabe á maioria se afastarem, ou enfrentar! É fato! Não é minha realidade, mas sim minha opinião. Isso é muito perigoso em um país em que 99% da população possui os pés na senzala! Pra refletir! Eu particularmente, adoro os irmãos primatas e acho eles uma dádiva. Não matam por matar, são sociáveis, respeitam as regras da hierarquia, gostam de sexo (mineiros-nato) e vivem em equilíbrio com a natureza sem depredá-la e tem mais...nunca ouví dizer que uma macaca tomou citotex pra matar o próprio filho. continuar lendo